Peles negras em um Estado branco
Peles negras em um Estado branco
Em 2025, o II Colóquio Encruzilhadas Culturais propõe um espaço de escuta, criação e articulação entre práticas de resistência, produção de saberes e políticas públicas no campo dos Direitos Humanos e da Saúde Mental, com ênfase nas vivências da população negra e indígena no Brasil.
Assumindo as encruzilhadas como metáfora epistemológica e política, o Colóquio se firma como um território fértil de encontros entre intelectuais, artistas, ativistas, profissionais da saúde, operadores do Direito e estudantes comprometidos com a vida diante da necropolítica. Em sua segunda edição, o evento integra oficialmente o Novembro Negro da UFMG, reafirmando seu impacto cultural e político na cidade de Belo Horizonte e seu compromisso com o combate ao racismo e todas as suas estruturas.
A programação contará com duas conferências principais, comunicações coordenadas, intervenções artísticas e o lançamento da chamada pública para o Volume 2 da coletânea "Encruzilhadas Culturais: Direitos Humanos, Saúde Mental e Resistências”, que reunirá contribuições inéditas em diálogo com temas como: direitos fundamentais, genocídio da juventude negra, encarceramento em massa, epistemologias negras, subjetividades dissidentes, cuidado comunitário e justiça social. Para aprofundar essa escuta e nomear os atravessamentos históricos que sustentam o adoecimento das populações racializadas, recorremos ao pensamento de Frantz Fanon como guia ético-político desta edição.
No seminal Pele Negra, Máscaras Brancas, Frantz Fanon expôs as feridas profundas deixadas pelo colonialismo no corpo e na psique dos sujeitos racializados. Fanon nos revela que o racismo não se limita a práticas externas de exclusão, mas se infiltra nos modos de existência, linguagem, desejo e sofrimento, impondo à pessoa negra a necessidade de vestir "máscaras" para sobreviver em uma sociedade estruturada pela branquitude. Essa violência psíquica, que molda subjetividades sob o peso do olhar colonial, opera como continuidade do trauma colonial, travestido de normalidade institucional, afetiva e epistemológica. Como afirma o autor, “não sou apenas responsável pelo meu corpo, mas por minha raça e por meus ancestrais” (Fanon, 2008, p. 122), indicando o fardo coletivo que a negritude carrega em um mundo fundado sobre sua desumanização.
Partindo dessa chave de leitura fanoniana, o II Colóquio propõe o mote "Peles negras, Estado branco", para iluminar a interseção entre saúde mental e racismo estrutural no Brasil. A expressão evoca a persistência de um Estado que se apresenta como universal, neutro e racional, em suas estéticas e éticas, mas que continua operando como aparelho de reprodução da branquitude, seja pela omissão no cuidado, pelo encarceramento em massa, pela militarização dos territórios racializados ou pela recusa em reconhecer as epistemologias e modos de vida negros e indígenas. Nesse campo de tensão, a pele se torna um campo de batalha e um espaço de memória, onde as marcas do abandono estatal adoecem, mas também de onde insurgem resistências, saberes e possibilidades de cura. Fanon nos ensina que só há saída no confronto com as estruturas do poder, entre os escombros, forjamos justiça social e palavra viva.
Diante das feridas abertas do colonialismo, que persistem no sofrimento psíquico, na exclusão social, na exploração econômica e na violência institucional, o II Colóquio se inscreve como gesto de escuta radical, denúncia crítica e reconstrução coletiva.
Te convido a se juntar a nós.
Axé, memória e palavra viva.
Prof. Dr. Seu João Xavier